Luzias
Quando assumir o cargo de Prefeito de Santa Luzia,nesta sexta-feira, 13 de julho, logo, o ex-delegado da Polícia Civil Christiano Xavier, 41, vai ter que se debruçar sobre aquele que é o mais urgente de todos os graves problemas enfrentados pela histórica cidade: sua expansão desordenada, com a construção de dezenas de conjuntos habitacionais, sem qualquer estudo de impacto. É como se alguém tivesse dado carta branca às construtoras – elas são muitas: Precon, Encampp, Vic, Tenda, MRV e tantas outras – para semear seus prédios por onde bem entenderem, mesmo que isso signifique inviabilizar a vida em Santa Luzia. São tantos os conjuntos habitacionais e há tantos mais projetados que, se nada for feito, a cidade se tornará ingovernável.
Contando cerca de 220 mil habitantes, Santa Luzia, com seus mais de três séculos de história, sofre há anos com todo tipo de mazela: falta de hospital, saúde no CTI, transporte público abaixo da crítica, tocado pela mesma empresa há mais de 30 anos, educação em mau estado, com uso de contêiners, sem ventilação, como sala de aula. Pagando a maior taxa de iluminação pública do Brasil, 30% dos moradores vivem às escuras, contribuindo para os altos índices de criminalidade. É uma cidade há muito abandonada. E é nessa cidade, carente de tudo, que as construtoras resolveram fazer a sua “farra imobiliária”.
Centro Histórico
Não cabe outra denominação para o que as construtoras estão fazendo na cidade. Acompanhado do fotógrafo Heli Lara Lima, o Luzias percorreu vários pontos do município e colheu estas fotografias, para dar uma mostra aos luzienses de como as construtoras, apoiadas numa Lei de Uso e Ocupação do Solo, aprovada na administração Carlos Calixto, no final de 2013, estão deitando e rolando. Não poupam nem a área histórica da cidade: há poucos meses o Ministério Público embargou a construção de 55 prédios de cinco andares, do Programa Minha Casa, Minha Vida, em frente ao Rio das Velhas, na antiga fazenda de Vicente Araújo.
No bairro Boa Esperança, vizinhos denunciam o enorme tapume que esconde o trabalho de base para construir oito prédios de seis andares cada um. Algum estudo do impacto que esse empreendimento terá no pacato bairro? Nenhum.
Quem vai em direção ao Mosteiro de Macaúbas, no Córrego Tenente, se depara, à direita, com uma placa enorme do Residencial Villa Bella Lyon (Fase 1) – todos eles têm nomes bestamente pomposos, quase sempre sem nenhuma ligação com o lugar -, anunciando o financiamento pela Caixa Econômica Federal de dezenas de casas e apartamentos. Da estrada, dá para ver a construção, a todo vapor.
Dano ao patrimônio
Na primeira entrevista coletiva que concedeu depois de eleito, o Prefeito Christiano Xavier afirmou que está mantendo contato com as construtoras. Explicou que muitos desses empreendimentos imobiliários não têm o “Habite-se” e possuem TACs (Termo de Ajustamento de Conduta) com o Ministério Público. Ele mencionou especificamente o condomínio Residencial Vista do Sol, que vem sendo erguido pela construtora Tenda, responsável pela destruição de patrimônio histórico da Fazenda Baronesa. O absurdo é que, como medida compensatória para o município pela destruição, a Tenda vai construir uma rotatória no bairro Belo Vale. O Prefeito eleito acha que isso “é pouco” e diz que é preciso “rever essas contrapartidas, não apenas em rotatórias, mas em escolas, mobilidade para as pessoas”.
Antes de exigir qualquer contrapartida às construtoras, é preciso assegurar que tenham um mínimo de bom senso. Veja o que elas estão fazendo. Na Avenida Adair de Souza, também conhecida como Avenida Orthocrin, no Belo Vale, a Tenda está construindo esse Residencial Vista do Sol, um dos maiores empreendimentos dessa natureza em Santa Luzia – o negócio é colossal. Ali, vão morar milhares de pessoas. Os prédios estão sendo construídos em frente a outro enorme conjunto habitacional, o Nova Vida.
Uma moradora, Maria Aparecida Vitor, contou ao Luzias que fica preocupada vendo tanto apartamento sendo construído, “por que aqui no bairro não tem nenhum lazer para as crianças, a única escola é estadual e atende apenas estudantes a partir da quinta série. Eu mesma tenho que levar meu filho para estudar em outro bairro.” Não bastasse isso, “o transporte público aqui é muito ruim. A gente quase não vê ônibus.” E quando o Vista do Sol estiver habitado?
Espigões de 12 andares
Pertinho dali, ao lado da antiga sede da Orthocrin, na Avenida Brasília, quando a gente repara, toma um susto: prédios enormes já estão de pé, aguardando moradores, enquanto homens e máquinas constroem mais 11 blocos, de 12 andares, com oito apartamentos por andar. Faça as contas. É assustador. De repente, mais cerca de cinco mil moradores só naquele amontoado de prédios. Como a Prefeitura vai atender a tanta gente? Cadê a contrapartida das construtoras em termos de escolas, ruas mais largas, postos de saúde, etc?
Mas o cenário mais inacreditável está do lado de lá, no que foi um dia o aprazível bairro Chácaras Santa Inês. Num espaço de poucos metros um do outro, há pelo menos cinco grandes empreendimentos imobiliários. O único pronto é o Ville Tunísia – Tunísia é um país da África. Seus 10 blocos, com oito andares cada um, e quatro apartamentos por andar, construídos pela Precon, já começaram a ser habitados. Fica na estreita Avenida Pedro I.
Uma das moradoras do Ville Tunisia é Fabricia Rodrigues Rocha. Mudou-se para o apartamento financiado em dezembro, livrando-se do aluguel que pagava em Belo Horizonte. Pouco mais de 7 meses morando no lugar, ela tem muitas queixas: “Quem mora aqui precisa ter carro, porque aqui não passa ônibus. Também não tem escola. Tenho que levar meu filho para o Baronesa. Mas o pior é que aqui as crianças não têm onde brincar. Têm que ficar dentro dos apartamentos,” lamenta ela.
É a própria Fabrícia que nos aponta os outros conjuntos habitacionais nas imediações. Ela sabe que a situação vai piorar quando estiverem prontos. “Isso aqui vai ficar muito difícil”, diz, mostrando a alguns passos abaixo do Ville Tunísia o Ville Tóquio, outro empreendimento da Precon, com o que chamam de três “torres”, de 12 pavimentos.
Veja a propaganda do conjunto habitacional que, segundo o site da Precon, já está com 17% das obras concluídas:
Descendo uns 30 metros a estreita Rua Imperatriz Leopoldina, que cruza a Pedro I, está o Residencial Ponto Ipê: 15 prédios de cinco andares, com quatro apartamentos por andar. A enorme placa da construtora Ap. Ponto anuncia “300 famílias beneficiadas”. Serão mais de mil pessoas vivendo no conjunto habitacional, que deve ser ampliado, pois a mata ao lado já teria sido comprada para a mesma finalidade.
Exatamente em frente ao Residencial Ponto Ipê, a mesma construtora ergue o Residencial Ponto Hibisco, com sete blocos de cinco andares, que vai “baneficiar” 120 famílias.
E como se fosse possível lotar ainda mais a área, logo embaixo, na Rua Maria José Lara, a MRV Engenharia constrói o imenso Residencial Parque das Laranjeiras, com previsão de entrega para 2020.
Paramos aqui, pois queremos mostrar apenas a ponta do iceberg de um problema que só cresce. Há inúmeros outros conjuntos habitacionais sendo construídos desordenadamente em Santa Luzia. Uma questão crucial que deve merecer a atenção de Christiano Xavier, tão logo seja empossado, nesta sexta-feira, como novo e tão aguardado Prefeito de Santa Luzia.
3 Comments
Douglas
7 de janeiro de 2019, 21:02Ola, eu comprei um AP da MRV, o Serra das Larajeiras. E quero dizer que os novos moradores tambem, sao vitimas dessas construtoras. Pois, todos imaginam, que para uma construtoras realizarem grandes empreendimentos deveriam ter autorização e com toda burocracia em dia. e nao é isso que esta acontecendo, agora os apartamentos estao prontos e nao podemos morar devido a prefeitura nao liberar os apartamentos. Isso esta errado, concordo que deveriam cobrar multas, ou um plano de mobilidade da cidade, agora penalizar os compradores , isso nao esta correto..
REPLYMatheus@Douglas
22 de fevereiro de 2019, 09:33Temos que tentar encarar isso como uma oportunidade, tem que haver sinergia entre os moradores antigos e os novos. Estão chegando mais pessoas, mais pagadores de impostos, consumidores e contribuintes, isso vai fazer a arrecadação da prefeitura subir e o comércio crescer. serão mais vozes para reivindicar melhorias.
A curto prazo é claro que haverão alguns transtornos, mas isso também aconteceu no crescimento de belo horizonte, contagem e tantas outras, e os problemas aos poucos foram resolvidos.
Não adianta querer evitar o progresso e desenvolvimento urbano, precisamos de união para conseguirmos melhorias para todos, precisamos de líderes comunitários que nos representem e tenham diálogo com a câmara dos vereadores e a prefeitura.
REPLYMatheus Martins
22 de fevereiro de 2019, 10:09Temos que encarar isso como uma oportunidade, precisamos de sinergia entre os antigos moradores e os novos. São muitas famílias chegando, mas estas famílias não podem ser enxergadas como parasitas da cidade, estas famílias pagarão impostos diretamente à prefeitura, e contribuirão para a arrecadação indireta aquecendo o comercio da região, que vai se desenvolver e consequentemente pagar mais impostos, não só para a prefeitura, mas também para o estado de Minas gerais.
Estes novos moradores vão contribuir muito para o crescimento de santa luzia, que ganhará mais força, mais vozes, para reivindicar recursos estaduais para ajudar em seu crescimento.
As construtoras poderiam ter acordado previamente um plano de mobilidade e desenvolvimento junto a prefeitura, é claro, mas não o fizeram, mas agora "Inês é morta".
A curto prazo é claro que haverá alguns transtornos e efeitos colaterais da falta de planejamento, mas isso também aconteceu no desenvolvimento de Belo Horizonte, Contagem e tantas outras, mas os problemas aos poucos foram encontrando soluções.
Não adianta querer evitar o desenvolvimento urbano da cidade, precisamos de união para conseguirmos melhorias para todos, precisamos de líderes comunitários que nos representem e tenham diálogo com a câmara municipal e a prefeitura. E quem sabe estes representantes poderiam até mesmo ser uma associação dos síndicos destes novos conjuntos habitacionais, quando todos estiverem prontos?
Precisamos de União!
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