Déa Januzzi escreveu esta crônica para Rosa Werneck: “Em nome da amizade”

Déa Januzzi escreveu esta crônica para Rosa Werneck: “Em nome da amizade”
Rosa com Hugo, um dos irmãos. Ela dirige uma Ong que faz um importante trabalho social em Santa Luzia. Foto: acervo familiar

Só alguém com o nome de Rosa pode transformar uma certa manhã em poesia. Só alguém que é filha de dona Ephgenia, com “ph” e sem acento, pode ser parte de uma história que inclui perdas e despedidas, mas que de certa forma ensinam o que a gente precisa aprender ainda.

Em uma dessas manhãs insuportavelmente quentes, com a pele melada, abri o correio eletrônico e lá está mensagem de Rosa: “Para todas as mães: aquelas tranquilas, aquelas menos tranquilas, aquelas que deixam para lá, aquelas que não deixam pra lá, aquelas que não deixam nada passar. A todas as mães.”

Em seguida ela enviou o texto: Aos filhos, de autoria de Ana Guarnieri, que é um verdadeiro manifesto.” Eu lhe dei a vida. Mas não posso vivê-la por você. Eu posso mostrar-lhe caminhos. Mas não posso estar neles para liderar você. Eu posso levá-lo à igreja. Mas não posso fazer com que tu tenha fé. Eu posso mostrar-lhe a diferença entre o certo e o errado. Mas não posso sempre decidir com você. Eu posso comprar roupas bonitas. Mas não posso fazê-lo bonito por dentro. Eu posso aconselhá-lo sobre amigos. Mas não posso escolhê-los por você. Eu posso informá-lo sobre álcool e drogas. Mas não posso dizer “não” por você. Eu posso orar por você. mas não posso impor-lhe Deus. Eu posso dar-lhe amor incondicional por toda minha existência. E isso eu farei.

Só alguém como Rosa pode regar as manhãs ressecadas com mensagens como essa. Obrigada, Rosa, por absolver as mães de todas as culpas dessa missão quase impossível, que é educar. Obrigada,Rosa, por dizer às mães que elas não são todo-poderosas. Embora tenham uma ligação direta com Deus e com toda a milícia celeste, as mães são apenas representantes de algo maior. Só as mães, não é Rosa?

Só alguém como Rosa pode dar colo a todas as mães que acham que não fazem o suficiente, que precisam da certeza de que os filhos vão se dar bem nesta vida e não vão cair nos buracos do caminho muitas vezes Rosa às mães tem vontade de deitar em cima do buraco para que os filhos não fiquem em perigo constante para que não sangrem se por acaso tropeçarem.

Crônica publicada pelo Estado de Minas há exatos oito anos. Em novembro de 2012

Só você, Rosa, para dizer a todas as mães que sosseguem, pois os filhos terão que prosseguir sozinhos, mas os valores ensinados ao longo da vida vão emergir nos momentos difíceis. Eles se lembrarão, não é, Rosa, de todas as lições, da incansável ladainha das mães: “Não faça isso”, “presta atenção naquilo”. Eles jamais vão se esquecer que são seres em construção e moldados com argila do afeto e da compreensão, mesmo que tudo prove o contrário.

Só você Rosa, filha da professora Ephigênia e do senhor Elton, que não estão mais entre nós, para dizer que os pais continuam vivos dentro da gente, que eles nunca morrem. Que dona Efigênia, onde quer que esteja, continua como guardiã do amor de uma mãe por seus filhos.

Só você, Rosa, para mostrar que as mães fazem o melhor que podem e que, ao partirem, deixam o perfume das flores no jardins de Santa Luzia ou o abraço do ipê com Flamboyant, que representa o eterno amor dos pais. Só para dizer que qualquer dia desses vou aceitar o convite para um almoço aos pés das árvores, que não se separam mesmo depois de todas as tempestades e ventanias.

Qualquer dia, Rosa, pego o seu irmão Gustavo pela mão e desembarco no jardim de dona Efigênia. À sombra do ipê que abraça o Flamboyant, estaremos todos juntos. Contaremos histórias de vida e trocaremos lembranças de mães e pais que conseguiram criar filhos sólidos, altivos, que sempre abrigam os amigos em todas as estações.

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2 Comments

  • Dulce Maria Viana Moreira dos Santos
    11 de novembro de 2020, 09:46

    Adorei!
    Rosa é isso tudo dito por vc é muito mais!

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  • Olympio da Cruz Simões Coutinho Coutinho
    5 de janeiro de 2021, 14:10

    Grande e saudosa amiga. Companheira de tantos anos na redação do Estado de Minas e nos botecos da vida. Saudade da Déa, que sabia escrever coisas bonitas sobre gente bonita – assim como a Rosa.

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