Entidades lutam para impedir loteamento bem perto do Cemitério dos Escravos

Entidades lutam para impedir loteamento bem perto do Cemitério dos Escravos
"O Cemitério dos Escravos foi tombado pela Prefeitura Municipal de Santa Luzia-MG por sua importância cultural para a cidade." (ipatrimonio.org). Foto: Reprodução/Internet

Cinco entidades, entre elas a Pastoral da Terra, da Igreja Católica, estão buscando meios de impedir que seja levado adiante projeto que prevê a construção de um condomínio, com 109 casas, a 100 metros do local onde, no século 19, foram enterrados negros escravizados, marco importante da história de Santa Luzia

Luzias

Repercute muito mal entre os movimentos de defesa de Santa Luzia a decisão do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de aprovar, na última quarta-feira(23), relatório técnico do Departamento Municipal de Defesa do Patrimônio Cultural dando sinal verde para a construção de um loteamento com “109 lotes – 92  dentro de um condomínio fechado e 17 lotes localizados fora do condomínio,” segundo documento da Prefeitura.

Com nome pomposo, o Giardini Drapia Sahva Eco Residence , de responsabilidade da Sahva Empreendimentos Imobiliários Ltda, “desenvolvedora de imóveis”, com sede em Belo Horizonte, ficaria a 100 metros do Cemitério dos Escravos, um dos marcos da história de Santa Luzia. E a avenida de 18 metros de largura, prevista para ser aberta na área, estaria a apenas 50 metros do local onde, no século 19, foram enterrados os corpos de negros escravizados..

 Preocupadas com os danos que o Cemitério poderá vir a sofrer, caso o empreendimento seja levado adiante, cinco entidades assinaram nota lamentando “profundamente” a aprovação de projeto tão sensível, sem que tenha sido realizada sequer uma audiência pública, para que a população pudesse participar da discussão. São elas: Comissão Pastoral da Terra (CPT/MG), Movimento Salve Santa Luzia,  Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (CEDEFES), Movimento Negro Unificado de Minas Gerais (MNU/MG) e a Pastoral Afro Raízes Negras.

Importância do cemitério

Para se ter uma ideia da importância do Cemitério dos Escravos, basta ir ao site da Prefeitura, na página da própria Secretaria Municipal de Cultura e Turismo. Há um explícito reconhecimento da importância desse bem histórico:

“O Cemitério dos Escravos, da antiga sesmaria de Bicas, é um testemunho que remete à vida dos escravos, cuja mão de obra era empregada nas fazendas, bem como nos amplos setores da sociedade.

Outro ângulo do cemitério, tombado pela própria Prefeitura de Santa Luzia. Foto: Reprodução/Internet

Localizado a 7 km do centro de Santa Luzia, em uma estrada rural que deriva da MG 020, sentido Jaboticatubas, o contexto em que está inserido permite ainda hoje reflexões sobre sua implantação.

As pesquisas sugerem que tenha havido sepultamentos em meados do século XIX no local, onde o cemitério foi erguido, por ocasião do número de escravos nas fazendas, bem como dos ritos católicos com respeito à morte, presentes na estrutura de pensamento das casas-grandes.

A estrutura física do bem é em estilo de cantaria – que é ofício ou arte de talhar blocos de rocha bruta de forma a constituir sólidos geométricos, normalmente paralelepípedos, de variável complexidade, para utilização na construção de edifícios ou de muros. Tem área aproximada de 150 m² e possui uma cruz de madeira ao centro” – afirma o texto publicado no site da Prefeitura.

“Violenta direitos ancestrais”

Na nota divulgada, as cinco entidades afirmam que o empreendimento, sem os devidos estudos de impacto, “ resultará em prejuízos e danos irreversíveis ao Cemitério dos Escravos e à Comunidade Quilombola de Pinhões,” que também já se manifestou contra o loteamento.

A nota continua explicando que, na reunião em que houve aprovação do projeto, comandada pela secretária de Cultura e Turismo,  Joana Coelho, apenas os  representantes da sociedade civil  – Glaucon Durães e Ana Luiza Andrade, da Mitra Arquidiocesana de Belo Horizonte, e Aparecida Evangelista, da Associação das Mulheres Quilombolas de Pinhões – votaram contra.

O cemitério está precisando de reparos. Foto: Reprodução/Internet

Os conselheiros que votaram a favor do loteamento foram Marco Aurélio Fonseca, pela secretaria de Cultura e Turismo,  Luciana A. de Sá Machado, da secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação, vereador Cabeção (Paulo Henrique de Assis),representante da Câmara Municipal, e Wesley Soares, da Ordem dos Advogados do Brasil.

Aprovação anulada

“É injusta a pressa da Secretaria Municipal de Cultura de Santa Luzia em votar matéria favorável ao interesse econômico privado e a lentidão em adotar medidas de fiscalização, proteção, preservação e promoção do patrimônio cultural luziense, em especial, o afro-patrimônio.

Qualquer um que se proponha fazer atividades turísticas em Santa Luzia se decepcionará profundamente com o avançado estado de degradação do patrimônio material histórico cultural e com a massiva dificuldade de sobrevivência do patrimônio cultural imaterial” – afirma a nota, que termina pedindo a anulação da decisão tomada na reunião do dia 23 de novembro:

“Prestamos a nossa solidariedade aos Povos e Comunidades Tradicionais luzienses, vítimas, também, lamentavelmente da falsa política de ICMS Cultural da nossa cidade e reivindicamos a anulação da aprovação do empreendimento imobiliário questionado acima. “

E finaliza: “Reivindicamos o apoio de todas as autoridades competentes, inclusive do Ministério Público Federal. para que se impeça o início deste empreendimento imobiliário de alto padrão que trará muito lucro para algumas pessoas, mas prejuízos e danos irreparáveis para toda a comunidade.”

Nãio deixe de ver o vídeo, para saber mais sobre a relevância histórica do Cemitério dos Escravos:

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1 Comment

  • Marcia Duarte Lage
    6 de dezembro de 2022, 22:41

    É revoltante a ação insensível da construção civil contra patrimônios históricos, sítios arqueológicos, biomas. Passam por cima de tudo lavando dinheiro e distribuindo propinas, pois esses empreendimentos não têm importância social alguma. São uma casa a maus para ricos, enquanto pobres e trabalhadores não têm nenhum projeto a eles direcionado. Junto com as mineradoras, os empreendimentos imobiliários são o câncer do Estado.

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