Elisinha, símbolo maior de estilo do País

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  • 7 de março de 2018
Elisinha, símbolo maior de estilo do País
Elisinha chegando em jantar no Rio de Janeiro, em 1986 (Foto: Agencia O Globo e Folhapress)

Este texto sobre a luziense mais sofisticada e internacional de todos os tempos, Elisinha Moreira Salles – Elisa Margarida Gonçalves, no original – foi publicado na edição de 03 de junho de 2017 da revista Vogue:

Em fevereiro passado, o encantamento da plateia do Festival de Berlim diante de No Intenso Agora, novo documentário de João Moreira Salles, colocou, de certa forma, uma das grandes damas da sociedade brasileira de volta ao panteão que ela sempre ocupou: o das estrelas internacionais. Mãe do cineasta, Elisa Margarida Gonçalves, a Elisinha, não era atriz de cinema, muito menos musa fugaz das redes sociais. A ex-embaixatriz Moreira Salles foi uma das poucas brasileiras a realmente ter renome mundial e frequentar o jet set como o quintal de casa – fazem parte do grupo Carmen Mayrink Veiga, Perla Mattison, Aimée de Heeren, Andrea Dellal, Bethy Lagardère e Sylvia Amélia de Waldner.

Em evento de moda no Rio, em 1966 (Foto: Agencia O Globo e Folhapress)

Morta em dezembro de 1988, Elisinha tem papel definitivo no novo filme do filho, que recuperou imagens caseiras que ela gravou durante uma viagem à China em 1966, registrando o momento de efervescência da Revolução Cultural de Mao Tse-tung, quando poucas pessoas de outras partes do mundo ousavam fazer turismo no país comunista. O longa ainda reúne cenas de marcos históricos do turbulento ano de 1968 na França, na extinta Tchecoslováquia e no Brasil.

Essa faceta da ex-embaixatriz – uma mulher culta, renascentista, curiosa e politizada (ela chegou a escrever um diário sobre sua experiência chinesa na revista O Cruzeiro) – era a menos conhecida do grande público. À frente, tinham destaque na mídia sua inclusão nas listas das mais bem-vestidas do mundo, ao lado de Jacqueline Kennedy, da ex-imperatriz Farah Diba do Irã e da princesa Alexandra de Kent; a participação em míticos bailes como o do Preto e Branco, do escritor Truman Capote; ou os jantares concorridíssimos que dava na lendária casa da Gávea, onde funciona hoje o Instituto Moreira Salles.

Símbolo de elegância

Na volta da China, inclusive, uma coluna social noticiou que, ao chegar à terra de Mao e se deparar com a precariedade do hotel e dos serviços, “Elisinha teve de colocar a mão no sabão e lavar a própria roupa”. Aos olhos mais distantes, era difícil entender como aquela viagem havia sido feita por alguém habituado aos grandes salões de Paris e Nova York.

O traquejo social e a facilidade com que o grand monde abriu as portas para essa mineira de Santa Luzia – segunda mulher do embaixador e banqueiro Walther Moreira Salles e mãe de João, do também cineasta Walthinho e do banqueiro Pedro – ajudaram muito o marido em seu s desafios diplomáticos e empresariais. “Ela foi uma das mulheres mais elegantes que conheci”, me contou no ano passado o estilista Azzedine Alaïa.

A luziense mais ilustre de todas

“Além de tudo, era inteligentíssima”, diz o costureiro francês Hubert de Givenchy, que, aliás, tem uma história divertida sobre Elisinha e Wallis Simpson, a duquesa de Windsor. Ambas haviam comprado o mesmo modelito em sua maison, e Wallis telefonou para a embaixatriz perguntando se ela usaria a peça numa festa para a qual estavam convidadas. Elisinha respondeu que não, caso a duquesa quisesse vestir o dela. Wallis sugeriu não só que as duas fossem iguais, como passaria para buscar Elisinha. O episódio rendeu ainda mais risadas: a atriz Audrey Hepburn, também presente, estava com look idêntico.

Meses antes de morrer, aos 56 anos, Elisinha havia dado uma festa que sacudiu o soçaite carioca, merecendo até chamada de capa em O Globo: uma festa black-tie no Teatro Rival, em plena Cinelândia, em que a grã-finagem local, que não punha os pés ali nem de noite nem de dia, assistiu à peça Theatro Musical Brasileiro, de José Celso Martinez Corrêa. A turma foi recebida na entrada por cuspidores de fogo, malabaristas e até um urso da Escola Nacional de Circo. O jantar que se seguiu foi servido sobre toalhas de rendas da Ilha da Madeira, mas o menu era brasileiríssimo: angu com galinha ao molho pardo. Foi Elisinha também quem tornou a cozinha, antes de todo mundo, em “espaço gourmet” da casa. Por causa de obras que estava fazendo na sala de seu apartamento, em Copacabana, resolveu receber os convidados para um jantar em 1986 na cozinha, lançando a moda de tal forma que o assunto ganhou matéria de página inteira na editoria de cultura de O Globo.

Com o marido, banqueiro e empresário Walther Moreira Salles, e os filhos Pedro, Walthinho e João

Essa mulher discreta, apesar da fama, gostava de Samuel Beckett e Arthur Miller e mantinha a fleuma até quando dava repreensões públicas. Quando Ulysses Guimarães defendeu no Congresso Nacional as comodidades dadas aos políticos, ela escreveu uma carta ao Jornal do Brasil. “Como embaixatriz do Brasil, morei em Washington, onde tive oportunidade de visitar John Foster Dulles, Dean Acheson, Mike Mansfield, o então senador Lyndon Johnson, todos morando em casa própria, sem as mordomias dadas a deputados, senadores, parentes e funcionários de Brasília.” E finalizou: “Como pode o Brasil com esta dívida interna e externa sustentar todo esse funcionalismo com casa de graça!”. Mais atual, impossível.

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1 Comment

  • Lourdes
    23 de março de 2023, 17:12

    A dona Elisinha Moreira Salles uma senhora muito educada. Sempre me agradecia por tudo quando ia na casa da minha antiga patroa dona Tereza em Cabo Frio na Ogiva.

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