Gustavo Werneck, Estado de Minas
Bandeiras vermelhas, toalhas nas janelas, velas nas mãos e a fé permeando todos os cantos da velha cidade. Em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, milhares de pessoas participam, na noite desta sexta-feira (13), da procissão solene em louvor à padroeira da cidade e protetora da visão – o cortejo com a imagem passa pela Rua do Serro, passa pelas ruas Floriano Peixoto e Bonfim para depois subir a Rua Direita até o Santuário Santa Luzia, no Centro Histórico. À frente da festa tradicional de 13 de dezembro está o titular da Paróquia Santa Luzia, padre Felipe Lemos de Queirós, que se mostra feliz com o grande número de participantes, que tem previsão de 50 mil pessoas até domingo, o Dia dos Romeiros.
Para garantir mais tranquilidade aos romeiros, as barraquinhas foram transferidas para a Rua do Serro, no trecho conhecido como “atrás da igreja”. Padre Felipe adianta que, após as procissões, haverá shows no local. Neste ano, o jubileu tem como presidente o casal José Oswaldo Xavier e Flávia Patrícia Cota Xavier e vice-presidente Laura Cristina Leal Morais Lima e Leonardo Fernandes Lima. No domingo, Dia dos Romeiros, há também extensa programação (veja o quadro), com missas e procissão às 11h, e a Missa Sertaneja, às 12h, na Igreja do Rosário.
Uma novidade para moradores e visitantes está bem perto do altar: trata-se de uma imagem de Santa Luzia, deitada no esquife, a exemplo da existente na Igreja de São Jerônimo e Santa Luzia, em Veneza, Itália, onde estão os restos mortais da Virgem de Siracusa. Quem participar da festa poderá rezar diante da imagem de Nossa Senhora da Piedade, no altar de São José, do lado de quem entra no templo. Réplica da peça barroca que está no altar da basílica da Serra da Piedade, em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, ela foi entronizada no santuário, na semana passada, após conduzida pelo pró-reitor do Santuário de Nossa Senhora da Piedade, padre Carlos Antônio dos Santos.
HISTÓRIA E CULTURA – Símbolo de fé e marco na recuperação de bens culturais desaparecidos em Minas, o Santuário de Santa Luzia, ligado à Arquidiocese de Belo Horizonte. recebeu bênção oficial em 13 de dezembro de 1778. Padre Felipe destaca a importância espiritual, histórica e cultural do templo na vida do município tricentenário. “Trata-se de uma das matrizes mais bonitas de Minas. Erguida no século 18 no estilo joanino, ou segunda fase do Barroco – mais ornamentado e pomposo, embora delicado – a igreja, hoje santuário, tem grande significado na arte e arquitetura, mas também nos trabalhos pastorais e sociais.”
Visitar o Santuário de Santa Luzia é entrar num universo de fé, beleza e história e fazer descobertas. O altar de São José, por exemplo, tem um enigma a ser desvendado. Em 1989, durante a última restauração do templo foram encontrados, na parte de trás do retábulo, um compasso e um esquadro esculpidos na madeira e em policromia dourada, que estariam relacionados à maçonaria. Já que foi deixada uma passagem sob a mesa do altar, é possível ver, com nitidez, a talha com o esquadro – para os maçons, símbolo de retidão e integridade de caráter –, e o compasso, que representa equilíbrio, justiça e vida correta.
Pela tradição oral, as peças localizadas atrás do altar pertenceriam ao forro do interior do camarim, depois ocultado em razão da ligação com a iconografia maçônica. Estudiosos dizem que, como os entalhes do trono de São José são semelhantes ao altar-mor de Santa Luzia, é possível que ele estivesse à mostra no século 18. No século seguinte, a exposição numa igreja católica criaria problemas para os padres, pois a bula Syllabus, editada em 1864 pelo papa Pio IX (1792-1878) proibia as relações da Igreja com a maçonaria.
Também se torna impossível falar sobre o santuário de Santa Luzia, localizado em área tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG), sem destacar a campanha pelos bens desaparecidos em Minas, que, em 2019, completa 16 anos. No templo, estão três anjos barrocos – dois sobre o arco-cruzeiro e outro no altar de Nosso Senhor dos Passos – que simbolizam a luta empreendida por autoridades estaduais e federais para localizar imagens, retábulos e demais tesouros desaparecidos ou furtados de templos coloniais do estado. As peças em poder de um colecionador iriam a leilão no Rio de Janeiro (RJ), quando foram retiradas do pregão por ordem judicial e entregues ao Iepha, para perícia.
Conforme pesquisa da historiadora luziense Elizabete de Almeida Teixeira Tófani, a capela primitiva dedicada a Santa Luzia foi erguida por volta de 1701, formando-se no entorno um rancho para tropeiros que chegavam dos currais da Bahia a fim de abastecer a região das minas de ouro. “No início, quando era capela, ficava de frente para a Rua do Serro, e só depois que se tornou igreja é que ficou virada para a Rua Direita, como está hoje”, conta a pesquisadora.
A história se completa com informações contidas no Inventário do Patrimônio Cultural da Arquidiocese de BH/Pontíficia Universidade Católica de Minas. Entre 1721 e 1729, a capela foi ampliada por iniciativa do capitão-mor João Ferreira dos Santos e outros pioneiros com o apoio do padre Lourenço de Valadares Vieira, vigário de Sabará. Assim, o templo se tornou capela filial da freguesia de Santo Antônio de Roça Grande, já que Santa Luzia estava vinculada à Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará.
PROGRAMAÇÃO
DOMINGO (15) – Domingo dos Romeiros, no Santuário
7h, 8h30, 10h, 15h e 19h30
11h – Procissão dos Romeiros, saindo da Igreja do Rosário
12h – Missa Sertaneja, na Igreja do Rosário
19h30 – Missa no Santuário
Dia 22
19h30 – Missa da Gratidão, no Santuário
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