Gustavo Werneck
Estado de Minas
A rainha de Portugal, dona Maria I (1734-1816), nunca pôs os pés em Minas desde que chegou ao Brasil, em 1808, acompanhada do filho dom João VI (1767-1826). Quase dois meses antes, a corte portuguesa batia em retirada de Lisboa para escapar das tropas napoleônicas que chegavam à capital do reino. Agora, mais de 200 anos depois, um filme com a atriz portuguesa Maria de Medeiros (de “Pulp Fiction”) traz a soberana às alterosas, mais especificamente a Santa Luzia, Sabará, Jaboticatubas e Belo Horizonte.
Dirigido pela cineasta mineira Elza Cataldo (“Vinho de Rosas”, “Órfãs da Rainha” e outros), o longa “Maria, a rainha louca” teve cenas gravadas no Mosteiro de Macaúbas, na zona rural de Santa Luzia. Já no Centro Histórico da cidade, um casarão (propriedade particular) que pertenceu ao Barão de Catas Altas também serviu de cenário para a história de dona Maria I, chamada de “A piedosa” por uns e de “A louca”, por outros.
A ligação do mosteiro com a família real portuguesa remonta aos tempos de dom João V (1689-1750), avô de dona Maria I. Foi ele quem confirmou, em 1730, a doação da sesmaria ao alagoano Félix da Costa para construção do recolhimento feminino que deu origem ao atual mosteiro, um dos monumentos arquitetônicos mais importantes do interior do país. Extremamente católica, a rainha tomou o local sob sua proteção, tornando-se madrinha de Macaúbas.
As cenas gravadas na área externa do mosteiro, onde vivem as irmãs enclausuradas da Ordem da Imaculada Conceição, foram concluídas no dia 3. Conforme divulgado, o filme em finalização estará no Marché du Film do Festival de Cannes. Trata-se de uma produção da Persona Filmes em coprodução com Maria Zimbro, The Stone and the Plot e Lira Filmes.
JOIA DO BRASIL Mais antigo do que a Capitania de Minas (1720), quando se deu a organização política e administrativa do território mineiro, e anterior à chegada do primeiro bispo às Gerais (1748), dom Frei Manoel da Cruz, o Mosteiro de Macaúbas, tem sua história iniciada em 1714, pelas mãos do eremita Félix da Costa. Procedente de Penedo (AL) e navegando pelo Rio São Francisco, na companhia de irmãos e sobrinhos, ele demorou três anos para chegar a Santa Luzia, onde construiu uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, de quem era devoto.

O Mosteiro de Macaúbas, situado a 12 km do Centro Histórico de Santa Luzia. Foto: Reprodução/Internet
Antes de chegar a Santa Luzia, bem no encontro das águas do Velho Chico com o Rio das Velhas, na Barra do Guaicuí, em Várzea da Palma, ele teve a visão de um monge com hábito branco, escapulário, manto azul e chapéu caído nas costas nas costas. No século 18, quando estava proibida a instalação de ordens religiosas nas regiões de mineração, por ordem da coroa portuguesa, a fim de que o ouro e os diamantes não fossem desviados para a Igreja, havia apenas dois recolhimentos femininos em Minas: um em Macaúbas, outro em Chapada do Norte, no Vale do Jequitinhonha. Conforme os estudos, tais espaços recebiam mulheres de várias origens, as quais podiam solicitar reclusão definitiva ou passageira.
Na época do recolhimento, Macaúbas recebeu figuras ilustres, como as filhas da escravizada alforriada Chica da Silva, que vivia com o contratador de diamantes João Fernandes. Em 1847, o recolhimento passou a funcionar também como colégio, tornando-se um dos mais tradicionais de Minas – em 1789, dona Maria I havia terminado um plano de organização do colégio, o que só ocorreu quase seis décadas mais tarde.
Nas primeiras décadas do século 20, a escola entrou em decadência devido à chegada de congregações religiosas europeias com grande experiência na educação de meninas. O tempo passou até que, em 1933, a construção passou a abrigar o mosteiro da Ordem da Imaculada Conceição.
TIRADENTES A história de Dona Maria I é marcada pela morte de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes (1746-1792), mártir expoente da Inconfidência Mineira. Foi a rainha quem assinou a sentença de execução (enforcamento e esquartejamento) ocorrida no Rio de Janeiro em 21 abril de 1792
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